"DESIGN: OBSTÁCULO PARA REMOÇÃO DE OBSTÁCULOS?" - VILÉM FLUSSER

Oiii! O post de hoje é sobre outro texto do Flusser, sim, ele já praticamente o dono desse blog. Esse texto se chama "Design: obstáculo para remoção de obstáculos?" e, de verdade, é o meu preferido dos que já lemos até agora. Eu gostei muito por que ele ressalta a responsabilidade de projetar e como isso é tão importante e influencia diretamente a vida dos outros. 


O texto começa apresentando a ideia de que, mesmo quando um objeto é útil, ele ainda é um obstáculo no meu caminho. Assim, justifica-se a "dialética interna da cultura" - entendendo cultura como a totalidade dos objetos em uso -, ou seja, sempre há um obstáculo usado para remover obstáculos. Na primeira leitura eu não entendi direito essa parte, mas relendo faz sentido, ainda que seja paradoxal (acho que era esse paradoxo mesmo que ele queria destacar). Nesse sentido, os projetos seriam designs de que necessito para progredir e que, ao mesmo tempo, obstruem meu progresso. Então, vêm as reflexões que eu mais gostei. Flusser define uma questão política e estética:

"Como devo configurar esses projetos para que ajudem os meus sucessores a prosseguir e, ao mesmo tempo, minimizem as obstruções em seu caminho?"

Para o filósofo, todos os objetos de uso são uma mediação entre um homem e os outros, isto é, funcionam como uma ponte. Consequentemente, todos os objetos são intersubjetivos, problemáticos e dialógicos. Assim, o processo de criação e configuração dos objetos envolve a questão de responsabilidade e liberdade, pois o projetista está respondendo por outros homens. Então, se a criação é feita irresponsavelmente, prestando atenção só no objeto em si e desconsiderando a intersubjetividade, a criação se torna um estorvo, uma prisão para aqueles que vão usá-lo. E eu acho que isso, infelizmente, tem acontecido muito hoje em dia, até na arquitetura. O "design", o "desenho do projeto" parece muitas vezes ser a única coisa que importa. Não que eu ache esses aspectos sem importância, mas acho que existem outros igualmente importantes. 

Pensando na Arquitetura mais especificamente: se o arquiteto desconsidera  o cliente, suas necessidades, seus desejos, suas histórias e seus contextos, a Arquitetura perde o seu sentido (pelo menos na minha visão), se torna mais um objeto em si - mais para si mesmo do que para os outros. Então, vira "casa" de qualquer um e de ninguém ao mesmo tempo. E se isso acontece, em partes, é responsabilidade do projetista, pois ele deixou de dar atenção à intersubjetividade, à ponte que ele precisa construir com o outro para, assim, conseguir ajudá-lo, libertá-lo, e não criar mais problemas para ele. 

Para finalizar, Flusser diz que "A situação da cultura está como está justamente porque o design responsável é entendido como algo retrógrado". E eu concordo muito com isso, pois hoje em dia o comportamento mais comum é o de só seguir as tendências, de usar tais coisas, fazer de tais modos... e nesse turbilhão de coisas meio automáticas, a intersubjetividade, o pensar como isso vai impactar a vida dos outros acaba passando despercebido ou, quando percebido, é visto como algo ultrapassado (cringe! - acho que a palavra encaixa perfeitamente aqui). E isso é triste, além de, talvez, ser um reflexo de um individualismo exacerbado demais? Não sei, acho que já tô viajando muito. 

Mas, o Flusser termina dizendo que uma tomada de consciência da efemeridade de toda criação pode  tornar as criações mais responsáveis e, consequentemente, a cultura mais libertária. Ou seja, ainda temos uma saída e nem tudo está perdido. Na palestra da Natália, na última aula (que foi muiiito boa, aliás), ela falou uma coisa que se relaciona muito com essa tomada de consciência, por exemplo. Ela disse que era preciso tomar consciência corporal e espacial para fazer uma arquitetura realmente funcional e que não precisasse sempre ser reconstruída do zero e, com adaptações mais simples, gerasse menos resíduos. 


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